A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos atos de 8 de janeiro vai deixar, do mesmo lado, dois arquirrivais da política alagoana. Arthur Lira comandará a tropa do Centrão. Renan Calheiros reviverá o protagonismo da CPI da Covid. Ambos contra o golpismo
postado em 24/04/2023 03:30
Calheiros e Lira são inimigos íntimos da política de Alagoas, mas estarão juntos na defesa pela democracia – (crédito: Pedro França/Agência Senado – Cleia Viana/Camara dos Deputados)
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que vai investigar os atos de 8 de janeiro colocará, no mesmo time, dois históricos arqui-inimigos políticos: o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), e o líder da Maioria no Senado, Renan Calheiros (MDB-AL). Há décadas, os dois protagonizam uma disputa feroz pelo poder em Alagoas, que transbordou na última campanha eleitoral à Presidência da República. Calheiros se posicionou como o principal aliado de centro do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Nordeste, enquanto Lira manteve suas trincheiras armadas na defesa da reeleição de Jair Bolsonaro (PL).
Agora, como a comissão será mista — com membros indicados paritariamente pela Câmara e pelo Senado —, os dois estarão do mesmo lado, na defesa das instituições democráticas atacadas pelo movimento golpista. Contudo, deverão se digladiar pela conquista da relatoria dos trabalhos da comissão, posto de maior expressão do colegiado.
Os articuladores políticos do presidente Lula no Palácio do Planalto e no Congresso defendem a montagem de uma equipe com experiência no enfrentamento parlamentar e contam com Renan Calheiros como um dos comandantes dessa tropa de choque pelo lado do Senado. Na Câmara, Arthur Lira tem se mostrado um aliado confiável, cumpridor dos acordos de governabilidade com o Palácio do Planalto, comandando o Centrão com mão de ferro e brecando os arroubos da oposição bolsonarista.
Sua maior demonstração de força se deu antes mesmo da posse, ao costurar o acordo que viabilizou a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que permitiu ao governo iniciar o mandato, sem a pressão da falta de recursos para assegurar a continuidade de programas sociais defendidos por Lula durante a campanha.
Marcado pela atuação na CPI da Pandemia, quando enfrentou a feroz bancada aliada do então presidente Bolsonaro e produziu um relatório devastador para o governo de plantão, Renan — aliado de longa data de Lula — é nome certo na composição da CPMI e favorito a ocupar um dos dois principais cargos do colegiado, a presidência ou a relatoria. Lira, por ser presidente da Câmara, será o patrocinador do outro nome e terá voz de comando na ala ligada ao Centrão.
Tradicionalmente, a Casa que presidiu a última CPMI instalada indica a relatoria do colegiado subsequente. Se a regra for respeitada, a presidência da CPMI dos Atos Antidemocráticos ficaria com a Câmara dos Deputados, que indicou a relatora da CPMI das Fake News (Lídice da Mata, do PSB-BA), encerrada em dezembro do ano passado. Consequentemente, o Senado seria o responsável por indicar o relator, por ter indicado o presidente da CPMI anterior (Ângelo Coronel, do PSD-BA).
Assim como no cenário geral das duas Casas do Poder Legislativo, a indicação de nomes do governo acabará custando mais caro ao Palácio do Planalto na Câmara do que no Senado. Entre os deputados, o governo encontra território mais hostil e um Centrão com viés pendente mais à centro-direita. Apesar disso, Lira, desde a eleição de Lula, vem se posicionando ao lado da democracia. Logo após a eleição do petista, o presidente da Câmara foi o primeiro a reconhecer a vitória, como uma forma de frear qualquer aventura golpista do lado bolsonarista, que volta e meia flertava com uma virada de mesa em caso de derrota. Outro fato positivo ao governo é que o superbloco formado por Lira na Câmara é liderado por um aliado, o deputado federal Felipe Carreras (PSB-PE), do mesmo partido do vice-presidente, Geraldo Alckmin.
Casa Alta
Enquanto isso, no Senado, o apoio governista é mais robusto e estável. Além da boa relação com o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o maior bloco parlamentar é encabeçado pelo MDB, com Renan Calheiros como um dos mais influentes no partido e na Casa como um todo. Além de Renan, nomes como Eduardo Braga (AM), Marcelo Castro (PI), Jader Barbalho (PA) e o vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rêgo (PB) também estão alinhados com o Palácio.
O segundo maior bloco da Casa Alta é formado por PSD — partido com mais senadores — e o próprio PT, o que vai garantir ainda mais cadeiras para a bancada governista. O partido de Gilberto Kassab patrocina ministros e senadores da base, como Otto Alencar (BA), Omar Aziz (AM), Eliziane Gama (MA) e Zenaide Maia (RN).
Parte considerável desses aliados costuma colar suas imagens à de Lula para ganhar capital político durante as eleições. Portanto, o custo para o atual presidente da República conseguir apoio desses senadores acaba sendo menor. Além desses partidos de centro, legendas de esquerda, como o PT de Lula, possui oito senadores, além de PSB, PDT e Rede, que juntos, somam mais oito integrantes no Senado.
Essa junção de esquerda com MDB e PSD formou a tropa de choque na CPI da Pandemia que causou sérias ranhuras na imagem do governo Bolsonaro: Omar Aziz (presidente), Renan Calheiros (relator), Randolfe Rodrigues, Humberto Costa, Otto Alencar, além de integrantes da bancada feminina que se revezavam, como Simone Tebet, Eliziane Gama e Zenaide Maia.