“Podemos esperar uma política externa soberana, pragmática e realista para o governo Lula, em convergência com a demanda do povo brasileiro”, diz pesquisador da Universidade de Harvard
postado em 07/11/2022
Em seu primeiro discurso após a confirmação da vitória nas eleições de 30 de outubro, o agora presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) falou sobre as prioridades para seu futuro governo.
Entre os pontos destacados, Lula deu ênfase ao seu desejo de “reconquistar a credibilidade, a previsibilidade e a estabilidade do país” diante do restante do mundo.
“Hoje nós estamos dizendo ao mundo que o Brasil está de volta. Que o Brasil é grande demais para ser relegado a esse triste papel de pária do mundo”, disse Lula em seu discurso após a confirmação do resultado da votação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Durante seus dois mandatos anteriores (2003-2010), a política externa chamou a atenção da comunidade internacional. Em 2009, a revista britânica The Economist dedicou uma capa e um especial de 14 páginas ao Brasil, no qual afirmava que o país, de repente, havia estreado como ator relevante no cenário internacional.
Mas agora, no terceiro mandato de Lula, segundo analistas consultados pela BBC News Brasil, o caminho do presidente eleito provavelmente será mais difícil — e repetir algumas das conquistas de 12 anos atrás pode ser uma tarefa árdua em um contexto internacional totalmente distinto.
“Lula não vai conseguir repetir a mesma política externa que fez em 2003, mas pode tentar recuperar reconhecimento internacional do Brasil após o governo de [Jair] Bolsonaro”, diz Guilherme Casarões, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O cientista político ressalta que “reconhecimento internacional é diferente de estatura” no cenário global.
“O contexto de hoje é fundamentalmente diferente do de 2003. Naquela época havia um grande entusiasmo com a globalização, que sofreu vários reveses tanto em termos culturais, quanto políticos e econômicos desde então.”
“Outra diferença importante é que o mundo em que Brasil, Rússia, Índia e China se posicionavam como países emergentes — não só em termos econômicos mas também geopolíticos —, não existe mais. Temos agora uma ordem internacional articulada em torno de China e Estados Unidos”, explica Casarões.
Para Leticia de Abreu Pinheiro, professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), também vivemos em um mundo “completamente diferente” em termos de economia internacional.
“Não somente pelo tão comentado boom das commodities ter acabado, mas porque ainda estamos em um momento de guerra na Ucrânia, com um impacto muito negativo sobre a economia dos países europeus — que certamente reverbera no mundo todo e, portanto, no Brasil”, diz.
Mas segundo os analistas, apesar das condições distintas, é possível prever que temas como meio ambiente, direitos humanos e cooperação na América do Sul ganhem mais relevância nos próximos quatro anos.
Confira a seguir alguns dos principais pontos da política externa do futuro governo Lula, segundo seu plano de governo e a análise de especialistas no tema.
Cooperação e protagonismo
Em seu plano de governo, Lula destaca a intenção de “recuperar a política externa ativa e altiva que nos alçou à condição de protagonista global”.
“Nas minhas viagens internacionais, e nos contatos que tenho mantido com líderes de diversos países, o que mais escuto é que o mundo sente saudade do Brasil. Saudade daquele Brasil soberano, que falava de igual para igual com os países mais ricos e poderosos. E que ao mesmo tempo contribuía para o desenvolvimento dos países mais pobres”, disse ainda Lula em seu primeiro discurso após a vitória nas eleições.