Diálogos estão no relatório da Polícia Federal sobre o conteúdo do celular do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. Caso envolve militares inclusive da ativa.
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou pública na sexta-feira (16) a análise da Polícia Federal sobre o conteúdo do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Cid está preso desde maio em uma operação que apura suposta fraude em registros de vacina para favorecer o ex-presidente.
Registros encontrados no aparelho mencionam cinco militares em diálogos sobre atos e movimentos contra a democracia, em uma tentativa de manter Bolsonaro no poder. Um deles foi transferido para a reserva em abril deste ano.
Os militares citados pela Polícia Federal no relatório do celular de Mauro Cid são:
- Coronel Jean Lawand Junior
- General Édson Skora Rosty
- Tenente-coronel Marcelino Haddad
- Major Fabiano da Silva Carvalho
- Sargento Luis Marcos dos Reis
Veja a seguir os perfis:
Coronel Jean Lawand Junior
O coronel do Exército Jean Lawand Junior é mencionado pela Polícia Federal em uma troca de mensagens com Mauro Cid sobre um possível convencimento de Jair Bolsonaro para uma tomada autoritária de poder.
“Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer. Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso. O presidente vai ser preso. E, pior, na Papuda, cara”, afirmou em dezembro de 2022 a Cid.
Em resposta, o então auxiliar de Bolsonaro disse que o “PR [Presidente da República] não pode dar uma ordem…se ele não confia no ACE [Alto Comando do Exército]”.
Na última troca de mensagens com Cid, Lawand demonstrou estar decepcionado com a inação de Bolsonaro. “Soube agora que não vai sair nada. Decepção irmão. Entregamos o país aos bandidos”. Cid respondeu: “Infelizmente”.
Coronel de Artilharia, Lawand atualmente exerce o cargo de supervisor do Programa Estratégico ASTROS do Escritório de Projetos do Exército.
Ele se formou, em 1996, em Ciências Militares pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Tem pós-graduado em Ciências Militares pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO) e Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME).
Entre 2017 e 2020, chefiou o 6º Comando de Mísseis e Foguetes. Antes, foi Oficial de Ligação do Exército na empresa Avibras Aerospacial. Também exerceu o cargo de comandante do Corpo de Alunos da Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), em Campinas (SP).
Em março de 2021, o então presidente Jair Bolsonaro concedeu a ele a Ordem do Mérito Militar no grau de cavaleiro.
Ele havia sido nomeado para um posto diplomático nos Estados Unidos, mas o ato foi suspenso por decisão após a divulgação das mensagens.
General Édson Skora Rosty
Então general de Divisão do Exército, Édson Skora Rosty é apontado pela Polícia Federal como o militar mencionado em um áudio encaminhado por Lawand a Cid.
Em dezembro de 2022, o coronel do Exército escreveu ao então ajudante de Bolsonaro que “ele [em referência ao então presidente] tem que dar a ordem”, em alusão a tentativas de mantê-lo no poder.
Na sequência, Lawand encaminha o áudio, que afirma ter recebido de um “amigo do QG [Quartel-General]”.
“Meu amigo, na saída do QG [Quartel-General] encontro bom o ROSTY, SCmt COTER. Foi uma conversa longa, mas para resumir, se o EB [Exército Brasileiro] receber a ordem, cumpre prontamente. De moto próprio o EB [Exército Brasileiro] nada vai fazer porque será visto como golpe. Então, está nas mãos do PR [presidente da República]”, diz a mensagem.
Segundo a PF, o “nome ROSTY pode estar relacionado ao General de Divisão, Subcomandante de Operações Terrestres do Comando de Operações Terrestres do Exército Brasileiro, EDSON SKORA ROSTY”.
Rosty foi Subcomandante de Operações Terrestres do Exército Brasileiro entre julho de 2022 e abril de 2023. Ele foi transferido para a reserva no mesmo mês pelo presidente Lula.
Ele tem mestrado em ciências militares pela Escola de Comando e Estado Maior do Exército e pela Academia de Guerra do Exército do Chile. Foi comandante da 16ª Brigada de Infantaria de Selva das Missões em Tefé (AM) e comandante da 12ª Região Militar da Amazônia Ocidental, em Manaus.
Durante o governo Bolsonaro, exerceu ainda os cargos de diretor de Ensino e diretor de Civis, Inativos, Pensionistas e Assistência Social do Ministério da Defesa. Recebeu ainda do então presidente, em maio de 2022, a Ordem do Mérito da Defesa no grau de Grande-Oficial.
Tenente-coronel Marcelino Haddad
O tenente-coronel Marcelino Haddad Aquino Carneiro é apontado pela Polícia Federal como o responsável por encaminhar a Cid um conjunto de arquivos sobre o emprego das Forças Armadas para a “garantia dos Poderes constitucionais”. À época, ele era tenente-coronel de Comunicações
Os arquivos defendem a tese das Forças como “poder moderador”. Há ainda documento com uma consulta ao jurista Ives Gandra.
Nas respostas às questões, ele defende a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal dá às Forças o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de “inimigo externo ou crise entre poderes”.
Essa tese, entretanto, já foi refutada por juristas de diversas tendências, como o ministro Joseli Camelo, presidente do Supremo Tribunal Militar (STM), ministros do STF e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Atualmente, o tenente-coronel Haddad é comandante do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro da Reserva do Rio de Janeiro. Antes, foi assessor da Cooperação Militar no Paraguai.
Iniciou a carreira no Exército em 1996. Foi instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO). Também comandou o 16º 1º Pelotão de Comunicações de Selva, em Tefé (AM) e a 20ª Companhia de Comunicações Paraquedista, no Rio.
Major Fabiano da Silva Carvalho
O relatório da Polícia Federal menciona o major Fabiano da Silva Carvalho como o destinatário inicial da mensagem do jurista Ives Gandra sobre a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal dá às Forças o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de “inimigo externo ou crise entre poderes”.
O Portal da Transparência, que reúne dados dos servidores públicos da União, no entanto, indica a existência de somente um Fabiano da Silva Carvalho vinculado ao Ministério da Defesa.
Ele, porém, é tenente-coronel — patente acima de major — e exerce o cargo de adjunto da Seção de Doutrina e Estudos do Centro de Comunicação Social do Exército.
Sargento Luis Marcos dos Reis
O sargento do Exército Luis Marcos dos Reis ganhou seção especial na análise feita pela PF do conteúdo do celular de Cid. Dos Reis foi um dos presos pela PF na operação que apura fraude em cartões de vacina do ex-presidente e ajudantes, em maio.
Ele aparece pela primeira vez em uma conversa com Cid sobre manifestações de cunho golpista em frente ao Quartel do Exército de Goiânia (GO).
À época, Cid estava cotado para assumir o comando do Batalhão de Ações e Comandos de Goiânia, uma unidade de Operações Especiais da Força. A posse, no entanto, foi suspensa pelo novo comandante do Exército, Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
“Ao ser questionado sobre a manifestação Mauro Cid diz: ‘Mais fácil eu ajudar os caras do que tirar de lá'”, destacou a PF.
Segundo a PF, Dos Reis também participou dos atos golpistas de 8 de janeiro e chegou a subir na cúpula do Congresso. Ele ainda esteve no acampamento no Quartel-General do Exército em Brasília e incentivou a “tomada de poder pelas Forças Armadas”.
O documento enviado pela PF ao ministro Alexandre de Moraes indica que o sargento enviou vídeos e imagens com a participação dele nas invasões às sedes dos Três Poderes.
“Eu estou no meio da muvuca! Não sei o que está acontecendo! O bicho vai pegar!”, escreveu em uma das mensagens.
Dos Reis ingressou no Exército em 2004, no Rio de Janeiro. Participou de missões no Haiti. Entre 2013 e 2016 foi motorista e segurança pessoal do comandante do Exército.
De janeiro de 2020 a julho de 2022, foi supervisor na Ajudância de Ordens da Presidência da República 8 – diretamente ligado a Cid. Em julho de 2022, assumiu cargo de coordenador-geral de Mobilidade e Conectividade Turística no Ministério do Turismo. Foi exonerado pelo governo Lula em janeiro.
Segundo o Portal da Transparência, desde agosto passado está na reserva.